Auto-ajuda? Quem?

É impressionante o mercado desse subgênero literário chamado "Auto-Ajuda". Peguei, por exemplo, a seção dedicada a esse tipo de livro do site da Saraiva: chegam a 3000 os títulos! Isso quer dizer que o filão é gordo e tem muito espertalhão garantindo a sua boquinha. Mas venhamos e convenhamos: são tantos títulos semelhantes, tantas receitas... Alguém acredita que esses "guias" dão certo? Pelas vendagens, parece que sim. Analisemos alguns títulos, dividindo-os em categorias.

1. Categoria "como enriquecer":

Uns dos campeões em publicações é Donald J. Trump:
- Como Ficar Rico
- Com a Palavra, Os Vencedores
- Como Chegar Lá

Singelos e humildes os títulos, não?

Robert T. Kiyosaki é outra figura carimbada na categoria:
- Pai Rico, Pai Pobre (esse é clássico)
- Aposentado Jovem e Rico - O Guia do Pai Rico

E tem até uma dobradinha dos dois, Trump & Kiyosaki!:
- Nós Queremos Que Você Fique Rico!

Então, tá bom... Sem maiores comentários.

E esse aqui, será que ensina palpites para faturar a megassena?:
- Os Segredos da Mente Milionária, de T. Harv Eker


2. Categoria "auxílio espiritual/pessoal/comportamental":

O queridinho das pobres almas do momentos é Augusto Cury. Vejam alguns títulos do autor:

- Pais Brilhantes, Professores Fascinantes
- Você é Insubstituível
- Seja Líder de Si Mesmo - O Maior Desafio do Ser Humano
- Nunca Desista de Seus Sonhos

Alguns comentários a respeito dos títulos acima: tanto o primeiro quanto o segundo são bajulação barata, ou seja, dá ao leitor aquilo que ele quer ouvir - mesma tática usada por aí por tantos pastores interessados na $alvação de seus rebanhos. O segundo (Você é Insubstituível) é de uma obviedade atroz. Na época das clonagens, ninguém duvida que mesmo a Genética é incapaz de criar seres iguais, o que tornaria os anteriores substituíveis. Ninguém precisa comprar um livro para saber disso. Quanto ao terceiro, é mais uma variação em cima dos livros do precursor Lair Ribeiro, autor do "clássico" O Sucesso Não Ocorre Por Acaso". O último: Nunca Desista... realmente, mais obviedade e psicologia de botequim. Sabem aquele desenho que tem uma garça tentando comer um sapo e o mesmo, com os bracinhos ainda para fora, aperta o pescoço da ave para que ela não o engula, e logo abaixo da figura há a frase "Não desista nunca"? Pois é, tenho certeza que é muito mais motivador que essa obra do Dr. Cury.

Nessa categoria ainda se inserem obras como:

- Desvendando os Segredos da Linguagem Corporal, de Allan Pease,
- Quem Mexeu no Meu Queijo?, de Spencer Johnson
- Não Leve a Vida Tão a Sério, de Hugh Prather
- Como Fazer Amigos e Influenciar Pessoas, de Dale Carnegie

Todos obras cujos títulos já são auto-explicativos, ou, vejamos, pela ordem:

- o primeiro repisa pela enésima vez aquela cantilena do significado dos gestos;
- o segundo é uma pergunta idiota, e te faz pensar no rato que a escreveu;
- o terceiro reduz tudo à futilidade;
- o quarto reduz tudo ao interesse e à ganância.


3. Categoria "vida amorosa/sexual":

Esta é vasta que é uma desgraça...

- Por que os Homens Fazem Sexo e as Mulheres Fazem Amor ? de Allan Pease,
- Não Discuta a Relação - Como Melhorar seu Relacionamento Sem Ter que Falar Sobre Isso, de Steven Stosny,
- Será que a Gente Combina?, de Allan Pease (olha ele aí de novo!)
- A Mulher e Seus Segredos - Desvendando o Mapa da Alma Feminina, de Luiz Cuschnir

Mas não vou me prolongar na relação (digo, no relação no sentido de lista, eh! eh!) porque só de ler tais títulos as mentes mais... desenvolvidas, por assim dizer, começarão a ranger dentes de raiva e precisarão de ajuda que não a auto...

Há uma quarta categoria que eu até gostaria de incluir, a da auto-ajuda esotérica/religiosa, mas esse assunto de auto-ajuda me custa a paciência, então só vou lembrar de dois dos atuais grandes exploradores desse filão, sejam eles:

- Zibia Gasparetto, dona de pérolas como Tudo Valeu a Pena e Nada Acontece por Acaso;
- e o "polivalente" Augusto Cury, que ataca com títulos como Maria, A Maior Educadora da História e O Mestre dos Mestres - Jesus, O Maior Educador da História.

Essa gente escreve um livro atrás do outro e repisa sempre nos mesmos tópicos! E o povo continua comprando... Tá certo, muitos desses livros acabam custando menos de R$ 20,00, mas, pelo jeito, viciam, e tem gente que se gaba de ter a coleção inteira de certos autores. Leve-se em conta também que, para bem ou para o mal, pelo menos essas pessoas estão lendo. Por outro lado, tantos clássicos estão em qualquer livraria ou biblioteca para serem lidos, Graciliano, Lispector, Dostoievski, Cervantes, Borges, Saramago, Machado de Assis, tantos outros! Os filósofos clássicos, Platão, Aristóteles, etc., os contemporâneos Nietzche, Schopenhauer, Kant... Não seria tal leitura algo mais próximo de uma verdadeira auto-ajuda. Ou, como escrevi numa comunidade do orkut, se quer mesmo auto-ajudar-se, abra um livro de história, matemática, gramática, física ou biologia - esses podem realmente te levar mais longe.

Pra terminar, lá no orkut, mesmo, um colega bem lembrou um livro que pode ser rara exceção à regra no gênero auto-ajuda: A Arte da Guerra, milenar obra escrita pelo general Sun Tzu com o intuito de preparar soldados taticamente e, por conseqüência, para a vida. Tzu não escreveu visando lucro material - por isso tornou-se um tratado genuíno e imortalizado que até hoje tem seu valor.